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Autonomia Administrativa

O dia 8 de Agosto de 1901 figura como uma data imemorável nos anais deste arquipelago. Foi nesse dia que o conselheiro Ernesto Rodolfo Hintze Ribeiro, então presidente do conselho e ministro do reino, referendou um decreto concedendo á Madeira a autonomia administrativa nas mesmas bases em que já anteriormente fôra concedida aos distritos açoreanos. Não é sem dúvida uma autonomia com amplos poderes de administração local, mas representa um dos mais apreciáveis benefícios com que tem sido dotada a Madeira num longo período de séculos e certamente o maior de todos, no que diz respeito á concessão dos meios indispensáveis para a fácil realização de importantes melhoramentos materiais.

O decreto de 2 de Março de 1895, referendado por Hintze Ribeiro, João Franco e os outros ministros que então constituíam o ministério, deu aos distritos dos Açores a faculdade de poderem adoptar a autonomia administrativa concedida nos limites do mesmo decreto, quando assim o requeressem dois terços dos cidadãos elegíveis para cargos administrativos. A Carta de Lei de 22 de Maio de 1901 modificou algumas daquelas disposições e autorizou o governo a torná-las extensivas á Madeira. Foi, porém, o decreto de 8 de Agosto de 1901 que verdadeiramente estabeleceu a autonomia administrativa no distrito do Funchal, com as faculdades e atribuições consignadas no decreto de 2 de Março de 1895.

Essas faculdades e atribuições residem numa corporação administrativa, que tem o nome de Junta Geral, cuja organização e funcionamento diferem das suas congéneres do resto do país. Por ocasião da sua criação, tinha quinze procuradores de eleição popular, como representantes dos diversos concelhos, e reuniam-se em sessões ordinárias nos meses de Abril e Novembro. A Junta Geral elegia uma comissão executiva composta de três membros, que, nas sessões ordinárias de todos os procuradores; apresentava os relatórios das deliberações tomadas nos intervalos daquelas sessões.

O primeiro presidente da Junta Geral do Funchal e que a ela prestou relevantissimos serviços foi o conselheiro José Leite Monteiro e teve como primeiro chefe da sua secretaria o Dr. Manuel dos Passos Freitas, que tem revelado muito zelo e competência no desempenho do seu cargo.

Foi a partir do ano de 1902, em que se iniciou a arrecadação das receitas facultadas á Junta Geral, que esta corporação administrativa começou a realizar uma grande soma de melhoramentos públicos, especialmente na construção da rede de estradas. Essa acção administrativa da Junta Geral estendia-se também a muitos outros serviços públicos, uns já existentes e outros de criação nova, evidenciando-se continuamente os inapreciaveis benefícios que a este distrito trouxera a concessão da *autonomia administrativa+. Outros decretos posteriores vieram sancionar e dar situação legal a certos serviços da Junta Geral, mas não modificaram essencialmente a sua vida económica e administrativa. Além das repartições privativas da sua secretaria, tesouraria e obras publicas, ficaram especialmente a cargo da Junta Geral os serviços destinados á manutenção e conservação do Manicomio, Expostos e Infância Desvalida, Posto de Desinfecção Terrestre, Laboratório de Bacteriologia e Higiene, Policia repressiva de emigração clandestina, serviços agrónomos e pecuários e ainda outros.

O decreto de 31 de Julho de 1928 ampliou notavelmente a esfera da autonomia administrativa, alargando bastante as suas faculdades e atribuições, mas sobrecarregando-a com novos e pesados encargos, não lhe sendo facultadas as receitas compensadoras para a plena satisfação desses encargos. Entre estes contam-se os serviços dos ministérios do Comércio e Comunicações, Agricultura e Instrução e os do governo civil, policia cívica, saúde publica, assistência e previdência dependentes do ministério do Interior e Finanças.

As receitas da Junta Geral deste distrito desde a concessão da autonomia administrativa foram as seguintes:

AnoReceitas, escudos
1902-1903111.265$56
1903-1904129.793$24
1904-1905126.873$41
1905-1906132.229$93
1906-1907135.960$73
1907-1908135.520$46
1908-1909137.577$85
1909-1910144.417$00
1910-1911142.440$94
1911-1912147.558$26
1912-1913159.333$03
1913-1914227.783$61
1914-1915172.327$59
1915-1916220.129$35
1916-1917190.099$94
1917-1918187.367$06
1918-1919188.499$34
1919-1920234.687$92
1920-1921713.182$51
1921-1922969.750$37
19231.369.834$72
19241.150.708$29
19253.881.125$99
19263.741.561$78
19273.962.817$81
1º semestre de 19282.488.376$21
1928-192910.680.689$52
1929-193010.189.945$29
1930-193112.459.987$57
1931-193211.584.328$97
1933-193414.398.951$57
1934-1935 (18 meses)20.440.337$65
193613.414.867$46
193712.057.204$87
193816.054.913$04
193920.658.134$00

Foi então, como acima ficou dito, que se iniciou a realização de importantes melhoramentos públicos, especialmente na construção de novas estradas.

As vias de comunicação na Madeira, eram sem contestação possível, as piores de todo o nosso país, devido a variadas causas e especialmente ao inverosímil acidentado dos terrenos e ainda a outras incentiváveis condições do meio. A maior parte delas não merecia o nome de estradas, pois que na sua generalidade eram estreitas veredas praticadas no solo, de penoso e dificilimo piso, sobranceiras a insondaveis abismos e costeando os flancos de elevadas montanhas, oferecendo quasi sempre aos viandantes os mais graves incómodos e perigos. Até o ano de 1901, em que foi concedida a autonomia administrativa a este distrito, somente havia nove quilómetros duma boa estrada, que ponha a cidade do Funchal em comunicação com a vila de Câmara de Lobos. Começou então e prossegue ainda a construção duma larga rede de estradas, que dentro de poucos anos tornará fácil o percorrer-se toda a ilha em viação acelerada e serem rápida e comodamente visitadas as suas principais localidades.

As repartições da Junta Geral funcionaram em diversas casas, sendo pelo decreto de 12 de Agosto de 1919 cedido a esta corporação administrativa o edifício do extinto Seminário da Incarnação pela importância de 7.500$00 escudos e nele se instalou a maior parte das dependências da mesma Junta. Havendo o decreto de 25 de Abril de 1927 restituído á Comissão do Culto da Diocese do Funchal a posse do referido edifício do Seminário da Incarnação, passou a Junta Geral a instalar as suas repartições nas antigas casas do Hospital de Santa Isabel, que ali se acham amplamente acomodadas desde o mês de Outubro de 1933.

Pessoas mencionadas neste artigo

Dr. Manuel dos Passos Freitas
Primeiro chefe da secretaria da Junta Geral
Ernesto Rodolfo Hintze Ribeiro
Presidente do conselho e ministro do reino
José Leite Monteiro
Primeiro presidente da Junta Geral do Funchal
João Franco
Ministro do reino

Anos mencionados neste artigo

1901
Estabelecimento da autonomia administrativa no distrito do Funchal foi concedida a autonomia administrativa a este distrito, somente havia nove quilómetros duma boa estrada, que ponha a cidade do Funchal em comunicação com a vila de Câmara de Lobos
1902
Início da arrecadação das receitas facultadas á Junta Geral
1919
Pelo decreto de 12 de Agosto, foi cedido a Junta Geral o edifício do extinto Seminário da Incarnação pela importância de 7.500$00 escudos
1927
Pelo decreto de 25 de Abril, foi restituído á Comissão do Culto da Diocese do Funchal a posse do edifício do Seminário da Incarnação
1928
Ampliação da esfera da autonomia administrativa
1933
Em Outubro, a Junta Geral instalou as suas repartições nas antigas casas do Hospital de Santa Isabel