São Roque (Águas de)
No artigo Machico (Estação Sanitária de), fizemos já referência ás águas das fontes de São Roque da vila de Machico, que tem notáveis virtudes terapêuticas, como é geralmente sabido e como é afirmado por muitos e distintos médicos. Sendo hoje difícil encontrar-se o resultado da analise dessas águas, a que procedeu o ilustre químico e analista Charles Lapierre, julgamos de algum interesse reproduzi-lo neste lugar.
Os processos que segui são os mais usados neste género de trabalhos nos Laboratórios oficiais portugueses e estrangeiros.
Demonstraram estes ensaios que a água continha:
1.º - Resultados directos da analise
2.° - Agrupamento dos elementos (por litro)
A comparação entre a soma dos elementos determinados e o resíduo obtido directamente pela evaporação verifica a exactidão da analise.
No próprio dia da chegada das águas em Coimbra, tratei de fazer as sementeiras precisas nos diversos meios nutritivos para procurar: 1.º A quantidade de bactérias existindo num centímetro cúbico de água. 2.º A existencia de bactérias do grupo do Coli-bacilo a que se está ligando hoje grande importância.
1ª QUANTIDADE DE GERMENS Não descrevi os processos seguidos por já o ter feito no relatório sobre as águas do Funchal que dirigi á Ex.ma Câmara Municipal dessa cidade, e que foi impresso na Coimbra Medica e em jornais madeirenses. Contudo, repito, que não se deve ligar grande importância ao valor absoluto dos algarismos achados, visto o numero de germens, aumentar muito desde que a água esteja submetida a diferenças no meio, na temperatura, etc.. Pelo processo das placas de gelatina examinadas 8 e 13 depois da sementeira, achei:
2.° PESQUIZAS DE ESPECIES COLIFORMES A água submetida simultaneamente ao processo de Elsner e de Péré (vid. Relatório do Funchal) não apresentou nenhuma espécie coliforme nas numerosas placas semeadas. Deve-se ligar maior importância a este resultado do que ao precedente baseado no numero de germens. Nos primeiros dias apareceram duas colónias suspeitas pela sua aparência microscópica; faziam fermentar os assucares, mas não produziam indol. Passados seis dias liquefaziam a gelatina; por conseguinte não se tratava de bactérias do grupo do bacilo coli. O facto de não aparecer em estas espécies está de harmonia com a analise química e demonstra as boas condições de captação e canalização da água da fonte de «São Roque», não existindo entre esta e os terrenos próximos comunicação que pudesse dar lugar a inquinações que alterariam a pureza de água da fonte.
III CONCLUSÃO – A água minero-medicinal da fonte de «São Roque» pertence á classe das águas hypothermais Hyposalinas, Chloretadas-Sodicas.
Pela sua composição química assemelha-se no continente com as águas de Amieira, analisadas pelo Sr. Santos e Silva, e com as águas do Bicanho, e das «Geiras» (perto de «Amieira») de Fonte Nova (perto de Torres Vedras) também minero-medicinais e que analisei.
Tanto as minhas analises como as de «Amieira» foram publicadas na «Coimbra Medica».
Por analogia com estas águas cujos efeitos terapêuticos já são conhecidos, é natural que seja a água da fonte de «São Roque» própria para os casos patológicos em que as primeiras dão resultado positivo, por exemplo no escrofulismo, afecções cutâneas, perturbações gástricas, etc..
Porém não me compete entrar em desenvolvimento a este respeito, não sendo este o papel do químico, mas sim do clínico que á vista da composição da água e dos resultados colhidos pudera formular parecer scientificamente baseado.
Posso acrescentar que a analise bacteriologica indica que, a água parece apresentar-se em boas condições de captação.
Coimbra, 4 de Julho de 1896.
Charles Lepierre
Professor de química na Escola Industrial de Coimbra e preparador no Gabinete de Microbiologia da Universidade, sócio correspondente da Academia Real das Sciencias de Lisboa, Oficial da Ordem de São Tiago etc..»