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Canhas (Freguesia dos)

“... e passando huma ribeira que está além desta Ponta do Sol, traçou em huma ladeira huma igreja do apostolo Santiago, e além achou ainda o fogo que mandou pôr pela costa; pelo que não poderam passar, por estar o arvoredo muito cerrado, e haver grande fogo em parte delle. Por isso desceram a uma ribeira, e, sempre ao som da agoa, foram dar ao mar, onde acharam os bateis“. Este trecho de Frutuoso, que se refere á primitiva exploração feita por Zarco e alguns dos seus companheiros da descoberta, dá-nos noticia da sua passagem pelos terrenos que depois constituíram a freguesia dos Canhas e, portanto, das pessoas que primeiramente atravessaram as florestas virgens que cobriam os mesmos terrenos. É bem conhecida a origem do nome desta paroquia. Uma familia de apelido Canha, que ali se estabeleceu pelos primitivos tempos da colonização, deu ás suas terras o nome de Canhas, que depois se transmitiu á futura freguesia, e do que essas mesmas terras foram o antigo e originario nucleo. Afirmam alguns, e entre eles o autorizado comentador da Historia Insulana, que foi João de Canha, escudeiro do duque de Vizeu D. Diogo, um dos primeiros povoadores dos Canhas, que ali teve terras de sesmaria, aforando-as a D. Constança Rodrigues de Almeida, viuva de João Gonçalves Zarco, e que seu filho Rui Pires de Canha foi o fundador da capela de São Tiago, onde depois se estabeleceu a sede da paroquia. 0 ilustre anotador das Saudades ds Terra é, porém, de opinião que Rui Pires de Canha é colonizador mais antigo do que João de Canha, não indicando o grau de parentesco que porventura existiria entre estes dois individuos. 0 sentir mais comum e de varios nobiliarios que consultámos, é que João de Canha se estabeleceu ali primeiramente, sendo Rui Pires de Canha um dos seus descendentes e que também adquiriu varias terras dentro dos limites desta futura paroquia. O alvará regio de 30 de Janeiro de 1577 cometeu ao bispo diocesano D. Jeronimo Barreto a faculdade de criar esta freguesia, que somente alguns anos depois ficou definitivamente constituída, tendo sido desagregada da paroquia da Ponta do Sol. 0 primeiro vigario nela provido foi o padre Diogo da Silva, com a côngrua anual de 20$000 réis, que pelo alvará de 10 de Julho de 1653 passou a 19$000 réis em dinheiro, um moio e meio de trigo e uma pipa e meia de vinho. A Diogo da Silva sucederam, como parocos desta freguesia, Belchior Alvares de Araujo, Antonio Fernandes, Amaro de Freitas, Francisco Rodrigues e Antonio Novais Ferreira, no periodo decorrido da sua fundação até o ano de 1647. A nova paroquia instalou-se na capela de São Tiago, fundada, como dissemos por Rui Pires de Canha, sendo certo que outros a dão como edificada por Braz da Camara ou ainda por Rafael Castanho. Não sabemos quando a sede da freguesia foi transferida desta capela para a nova igreja, nem em que ano se procedeu á construção desta. Conjecturamos que se erigiu o novo templo no primeiro quartel do seculo XVI, sabendo no entretanto que em 1676 mandou o Conselho de Fazenda executar nele importantes reparações na capela-mor, e que D. José I, por alvará de 1752, ordenou que se fizesse a reconstruçãp da igreja paroquial. A primeira pedra foi lançada solenemente a 22 de Julho de 1753, sendo a 4 de Março de 1756 passado o alvará episcopal que autorizou a sua benção e sua abertura ao culto, o que teve logar pouco tempo depois. Numa visita pastoral ordenou o prelado diocesano ao paroco Antonio de Caires, que requeresse a criação dum curato, em atenção ao desenvolvimento que já tinha atingido a população, sendo o logar de coadjutor criado pelo alvará regio de 7 de Dezembro de 1731, com a côngrua anual de um moio e meio de trigo e uma pipa e meia de vinho. Existem nesta freguesia as capelas de Santo André Avelino, de Nossa Senhora dos Anjos e do Sagrado Coração de Jesus. Teve, mas já desapareceram, as capelas de São Tiago, de Nossa Senhora do Monte e Sant’Ana, de Nossa Senhora da Anunciação e de Nossa Senhora do Socorro. A todas elas faremos referencia especial no logar competente. Conserva ainda esta freguesia alguns dos antigos usos e tipicos costumes dos camponeses madeirenses, que por tôda a parte vão inteiramente desaparecendo. As saias de vestido, de fabrico caseiro, tecidas ás riscas de côres vivas e variadas, de aspecto tão pitoresco, e bem assim as capas curtas, de pano escuro, com bandas aos bicos e orladas de fita de sêda azul, são ainda geralmente usadas nesta freguesia, dando nos arraiais e ajuntamentos do povo uma feição caracteristicamente regional e sobremaneira interessante, que pena é vê-las substituídas por umas modas ridiculas, que tão mal se ageitam ás simples e modestas mulheres dos nossos campos. Uma velha usança ainda aqui predominante no modo do tratamento, em que sempre se faz o emprêgo da segunda pessoa do plural, não deixa de merecer o devido registo neste logar. Podeis ajudar-me?, ide lá, vinde cá, e tantissimas outras são as frases de uso comum e quotidiano no tratamento familiar dos habitantes desta paroquia.

Os seus principais sitios são Lombo da Piedade, Achada e Levada do Poiso, Anjos, Barreiro e Feiteiras, Carvalhal e Carreira, Serrado e Cova, Cruz, Fajã e Eiras, Lombo dos Canhas, Outeiro, Poiso, Salões e Levada da Madalena, Socorro e Vale e Cova do Pico.

Há ali um pequeno porto, chamado dos Anjos, por ficar no sitio deste nome, e neste sitio se levanta uma capela conhecida pela invocação de Nossa Senhora dos Anjos. 0 movimento comercial e de passageiros da freguesia faz-se principalmente pela vila e pôrto da Ponta do Sol. A pesar de poder considerar-se uma povoação do interior, pois que o mar apenas banha uma parte muito insignificante da sua costa, é no entretanto um centro fabril de certa importancia e muito superior a um grande numero de outras freguesias do litoral. Existem ali quatro fabricas de manteiga, uma de queijos, duas de aguardente, uma de serragem de madeira e uma de massas alimentícias.

Tem uma escola do sexo masculino, criada há cêrca de 50 anos, e uma do sexo feminino, de criação recente.

Destinadas á irrigação desta freguesia e tendo nela origem, existem as levadas do Pico e das Cruzes.

Os Canhas confinam ao norte com as serras que entestam com o Paul da Serra, ao sul com o oceano e Madalena do Mar, leste com a Ponta do Sol e oeste com o Arco da Calheta. Tem 3882 habitantes.

Pessoas mencionadas neste artigo

João de Canha
Povoador
Rui Pires de Canha
Fundador da capela de São Tiago
Zarco
Explorador

Anos mencionados neste artigo

1577
Criação da freguesia
1653
Alteração da côngrua anual
1752
Ordem de reconstrução da igreja paroquial
1753
Lançamento da primeira pedra do novo templo
1756
Autorização da benção e abertura ao culto

Localizações mencionadas neste artigo

Achada
Localidade
Anjos
Localidade
Arco da Calheta
Localidade
Barreiro
Localidade
Carreira
Localidade
Carvalhal
Localidade
Cova
Localidade
Cova do Pico
Localidade
Cruz
Localidade
Eiras
Localidade
Fajã
Localidade
Feiteiras
Localidade
Levada da Madalena
Localidade
Levada do Poiso
Localidade
Lombo da Piedade
Localidade
Lombo dos Canhas
Localidade
Madalena do Mar
Localidade
Outeiro
Localidade
Poiso
Localidade
Ponta do Sol
Localidade
Salões
Localidade
Serrado
Localidade
Socorro
Localidade
Vale
Localidade