Misericórdia de Santa Cruz
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O Boletim do Trabalho Industrial n.° 95, que já por mais duma vez deixámos citado, insere uma muito interessante e quanto possível completa noticia acerca desta Misericórdia, que vamos integralmente transcrever:
Parece averiguado que esta instituição de beneficência se fundou em principio do século XVI, na vila de Santa Cruz, tendo sido levantado o edifício próprio no ano de 1520. É, fora da cidade do Funchal, o estabelecimento mais importante no seu género, e foi de sua origem talhado com amplas acomodações em relação ao meio que servia.
Tendo sido cuidado e conservado, ainda hoje (1920) proporciona serviços de hospitalização a enfermos pobres, em razoáveis condições de conforto, o que se não da em nenhum outro concelho rural do distrito.
Entre os provàveis instituidores deste Hospital, criado pela Santa Casa da Misericórdia de Santa Cruz, citam-se como irmãos mesàrios de maior condição os nomes de Manuel da Costa Moniz, José Bettencourt de Freitas, Diogo Lopes Fernandes, António Mendes Bettencourt, António Baptista Spínola e Marcos de Aragão.
0 edificio desta Misericórdia experimentou importantes trabalhos de reparação nos anos de 1759, 1786 e 1892, a expensas da caridade pública, sem o que jà teria desaparecido; e em 1908 foi de novo reparado por ordem e conta do Estado.
Este edifício consta duma casa de dois pavimentos com uma grande capela e muitos compartimentos, como sejam amplas enfermarias, sala para farmácia, alguns outros quartos, casas de banho, etc., e casas de desinfecção e mortuària.
Dadas as dimensões e o estado do edifício, maiores e melhores serviços de hospitalização podia ele prestar, se os seus rendimentos o permitissem. Estes, porém, são muito escassos e para muito pouco dão, se a caridade pública os não acompanhar e vier regularmente ajudando.
Assim, os rendimentos próprios desta Misericórdia orçam por pouco mais de 200$ anuais, e é evidente que este valor, não acrescido dos auxílios da beneficência publica, para muito pouco pode chegar, mormente considerando-se nos maiores encargos que sempre resultam da conservação e exploração dum edifício de amplas dimensões.
Esta Misericórdia tem estatutos aprovados pelo Governo Civil do Funchal em 1889.
Em 1910 a direcção e prestação de todos os serviços internos e de enfermaria no hospital desta Misericórdia estavam a cargo das irmãs hospitaleiras franciscanas, que ali prestaram bons serviços, e que foram as mesmas que improvisaram um hospital no Lazareto de Gonçalo Aires, na cidade do Funchal, quando da última epidemia de variola que assolou a Madeira.
Tendo sido suprimido o serviço destas religiosas, continuou o Hospital da Misericórdia funcionando sob a direcção duma mesa gerente eleita de entre os irmãos da Confraria de Santa Isabel, e com o concurso do pessoal de enfermaria e farmácia que ficou sendo parcialmente o mesmo que existia, mas secularizado.
Os serviços de farmàcia passaram porém a ser dados de arrendamento, continuando no entanto o mesmo pessoal manipulador empregado na Misericórdia.
Em 1913 a receita desta Misericórdia foi de 1.034$68, incluindo um saldo de 640$ do ano anterior, sendo a respectiva despesa de igual valor e onde se compreende a verba de 400$ gastos em reparos da capela do Hospital.
O pessoal do estabelecimento compreende um médico com 36$, um escrituràrio com 36$ e duas enfermeiras a 30$, tudo anualmente.
O movimento de doentes foi em 1913 de 14 doentes, 6 homens e 8 mulheres, dos quais melhoraram 9, faleceram 3 e ficaram em tratamento 2.
Do exposto se vê, que relativamente pequenos são os serviços que este hospital pode prestar ou a respectiva Misericórdia, mas que dadas as recomendàveis condições da sua instalação, bem digno era de protecção eficaz que lhe permitisse aumentar a hospitalização e benefícios que proporciona, correspondendo assim melhor às necessidades crescentes do meio que serve, que é hoje uma vila das mais importantes do distrito, sede de concelho e de comarca.