Fonseca (Dr. José Maria Martiniano da)
Os medianamente versados em assuntos de história pátria sabem que no dia 7 de Maio de 1829 foram justiçados na Praça Nova da cidade do Porto dez individuos, vitimas da intolerância do governo miguelista. Entre eles contava-se o madeirense Dr. José Maria Martiniano da Fonseca, como já referimos no artigo consagrado ao conselheiro José Ferreira Pestana. Pouco sabemos da biografia do Dr. Martiniano da Fonseca e se não fora a sua trágica morte, é possível que o seu nome tivesse ficado inteiramente desconhecido para nós. Nasceu na freguesia da Sé desta cidade a 16 de Outubro de 1794 e era filho de José Maria da Fonseca, inspector geral da Agricultura, e de D. Ricarda Umbelina Spinosa. Formou-se em leis pela Universidade de Coimbra e exerceu a advocacia no Funchal. Tendo-se organizado na cidade do Porto uma junta revolucionária destinada a combater a usurpação miguelista, quis o governador e capitão-general da Madeira, Travassos Valdez, aderir ao movimento iniciado por essa junta e pôr-se em comunicação directa com ela por intermédio de pessoa idónea e de inteira confiança que pudesse cabalmente desempenhar a importante e arriscada missão de que ia encarrega-la. A escolha recaiu no Dr. José Maria da Fonseca, que saiu do Funchal a bordo dum navio americano a 30 de Junho de 1829 e entrou no Porto a 13 do mês seguinte, ao tempo em que já nesta cidade se tinha reconhecido o governo de D. Miguel. Era critica a situação do emissário do governador da Madeira, que tentando aproximar-se do desembargador Caldeira Velez, secretario da Junta revolucionária, foi preso por suspeitas e conduzido ás cadeias da Relação. Uma busca feita ao seu domicílio e os papéis que aí encontraram, que era a correspondência de Travassos Valdez, tornaram em certeza aquelas suspeitas. O Dr. José Martiniano da Fonseca estava para sempre irremediavelmente perdido. Depois de nove meses de prisão, foi julgado com outros réus e a 9 de Abril de 1829 se proferiu a sentença condenando dez deles a pena ultima e outros a diversas penas. A iniqua e revoltante sentença executou-se no dia 9 de Maio daquele ano. Ergueram duas forcas no largo da Praça Nova e ali sofreram a pena capital os dez réus, sendo o Dr. José Martiniano da Fonseca o oitavo que subiu os degraus da forca. Para se dar completa execução á sentença, foram cortadas as cabeças ás vitimas e colocadas em diversos pontos da cidade. A do Dr. Fonseca esteve exposta três dias em S. João da Foz, e no dia 12 de Maio a irmandade da Misericórdia a conduziu para a sua capela e ali a fez sepultar juntamente com os despojos mortais dos outros réus sacrificados á ferocidade do governo miguelista. Sete anos mais tarde, a 6 de Fevereiro de 1836, se procedeu á exumação das cinzas daquelas vitimas, sendo todas recolhidas numa urna e novamente sepultadas na igreja da Misericórdia, aguardando a oportunidade de mais condigna e apropriada sepultura. Foi em 1875 que no cemitério do Prado do Repouso, no recinto pertencente á Misericórdia do Porto, se levantou um elegante mausoléu destinado a guardar os despojos mortais dos indivíduos justiçados no dia 7 de Maio de 1829 e de mais dois que sofreram igual pena no dia 9 de Outubro do mesmo ano. A trasladação dos últimos restos dessas vitimas, que ficaram conhecidas pelo nome dos Doze Martires da Pátria, revestiu uma desusada e brilhantissima imponência, formando-se um préstimo fúnebre em que tomaram parte milhares de pessoas e toda a guarnição do Porto, sendo um dos mais aparatosos e significativos cortejos que se têm organizado no país, como se pode ver no opúsculo. Memória Descriptiva da trasladação das ossadas dos Doze Martyres da Pátria, publicada no ano de 1878.